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Textos 15 e 16 Cassany

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Mensagem por Susane Dom Mar 26, 2017 9:36 pm

No artigo "Traducción por fans para fans": organización y prácticas en una comunidad hispana de scanlation, Valero-Porras & Cassany (2016) investigam as práticas e o funcionamento de uma comunidade que pratica o que eles chamaram de tradução colaborativa digital, que no contexto da pesquisa é a “scanlation”. Os autores também pretendem identificar como os sujeitos utilizam os recursos tecnológicos para superar dificuldades linguísticas, geográficas e temporais. O termo “scanlation” é definido no artigo como sendo o escaneamento, a tradução e a distribuição de mangás (gênero de origem japonesa análogo às histórias em quadrinhos, mas com características próprias que não foram destacadas nesse artigo) feitos por um grupo de fãs na internet, de maneira ilegal. O objetivo dos “scanlators” é traduzir os mangás no mínimo de tempo possível para que o público leitor não tenha que esperar pelo lançamento das versões oficiais traduzidas. Essa atividade apoia-se em recursos digitais e na colaboração on-line, é complexa, envolve diversas habilidades e acontece de forma ilegal e sem fins lucrativos.
Os autores ressaltam que há trabalhos que relacionam essas práticas de tradução por fãs a aprendizagem e estratégias de tradução (Inose, 2012; O'Hagan, 2008 apud Valero-Porras, Cassany 2016), além de  “aprender lenguas extranjeras o comprender cómo grupos sociales distintos desarrollan maneras culturalmente específicas de construir significados con recursos semióticos particulares (Huang, Archer, 2012; Valero-Porras, Cassany, 2015)”.
Para compreender o scanlation, os autores se valeram de duas teorias. A primeira é o conceito de cultura participativa (Jenkins, 2006; Jenkins et al., 2009 apud. Valero-Porras & Cassany, 2016), a qual eles entendem como “agrupaciones de individuos que sienten devoción por las mismas actividades o productos culturales (a los cuales vinculan su identidad y estilo de vida) y participan en prácticas sociales de creación, modificación, interpretación, curación o distribución de contenidos relacionados con esse interés.” (p. 3). A cultura de participação é posta em oposição à cultura de consumo, pois, diferentemente desta, em que os sujeitos são consumidores passivos dos produtos, os envolvidos naquela apresentam novos papéis que lhes asseguram um lugar de protagonismo frente à produção e à disseminação do gênero, visto que expressam suas práticas sociais, estimulam a criatividade e o compartilhamento de conteúdos, e promovem a interação entre os membros (Jenkins et al. (2009) apud Valero-Porras & Cassany, 2016).
A segunda teoria utilizada foi a dos Novos Estudos de Letramento (NEL), que analisa essa prática por meio de um olhar mais etnográfico sobre a leitura e a escrita, que são entendidas como práticas sociais situadas historicamente e definidas pela cultura dos sujeitos que as praticam. Para os NEL, “el scanlation constituye una práctica letrada digital vernácula que implica maneras culturalmente aprendidas de construir y manipular el significado de los textos y de relacionarse con otros fans” (Barton, 2007; Wolf, 2010 apud Valero-Porras & Cassany, 2016). De acordo com os NEL, o scanlation se relaciona com a criatividade, pois transforma o produto original em outro diferente à medida que introduz significados novos, projeta a identidade dos fãs e contribui para uma cultura compartilhada.
Os “scanlators” se organizam de forma estruturada, utilizando termos relacionados ao mundo profissional, como “projetos”, “chefes”, “equipe” etc., além de desenvolverem uma espécie de produção em cadeia. Cada membro possui uma função, que implica habilidades e conhecimentos específicos, sejam eles linguísticos, tecnológicos ou culturais. As funções descritas pelos autores foram: a do coadministrador, que obtém as páginas scaneadas dos mangás, entrando em contato com quem as traduziu do original numa primeira língua (geralmente o inglês) e as encaminham para os “cleaners”; os “cleaners”, que limpam digitalmente os balões, retirando os textos e utilizando programas de edição específicos, e decidem o que deve sair ou não (algumas onomatopeias e expressões do original são mantidas); os tradutores, que traduzem do inglês para o espanhol, geralmente utilizando um processador (Google Tradutor e outros), e que utilizam alguns recursos tipográficos que sinalizam para os compositores a página e o tipo de texto; os compositores, que inserem o texto traduzido nos balões, escolhendo fonte, cor, disposição e outros detalhes que são importantes para a criação de sentido no texto; e os corretores, que revisam a forma, a tradução e o conteúdo do texto, reportando alguma inconsistência para o coadministrador, que confere e, por fim, publica.
As ferramentas utilizadas no processo foram, principalmente, o Google Tradutor, ferramentas de edição, como o Photoshop, além de elaboração de tutoriais de limpeza, tradução e edição de mangás, feitos por e para os próprios membros e divulgados nas redes sociais do grupo.
Valero-Porras & Cassany também identificaram uma ética exercida dentro do grupo composta por preceitos como: não traduzir mangás publicados oficialmente na língua em questão (espanhol) e apagar os que forem traduzidos e ainda estiverem no site; não cobrar pelo trabalho; não roubar “projetos” de outros grupos; reconhecer trabalhos de outros grupos creditando-os, entre outros aspectos.
Como conclusão, os autores perceberam que, apesar de ser uma prática marginalizada, os “scanlators” utilizam termos da indústria cultural oficial, e que eles tomam cuidado para manter práticas semióticas que valorizem o gênero e o próprio grupo, considerando que a recriação do contexto cultural asiático é tão ou mais importante que a qualidade da tradução. Além disso, Valero-Porras & Cassany propõem que uma revisão do conceito de “prática digital vernácula” (Barton, Lee, 2012, 2013) deve ser feita, considerando que essa prática não deve somente se relacionar à criatividade individual ou espontânea de quem a pratica.

O artigo “Multimodality and language learning in a scanlation community” (texto 16) dos mesmos autores (Valero-Porras & Cassany, 2015) também traz uma análise do “scanlation”, focando a questão da aprendizagem de língua estrangeira por meio dessas comunidades. Eles destacam o caráter multimodal das comunicações da atualidade, ressaltando que os métodos de ensino que isolam a linguagem dos aspectos semióticos são incompletos (“contemporary communication is multimodal, so FL teaching and learning methods that isolate language from the rest of semiotic modes are incomplete (Potts, 2013)” p. 10).
Nesse artigo, os autores identificaram que Shiro (sujeito da pesquisa que é a mesma do primeiro artigo que resumimos aqui) tinha consciência dos aspectos semióticos que contribuíam para que ela compreendesse o texto e fizesse a tradução do inglês para o espanhol, e construiu estratégias para isso, como prestar atenção às imagens para expandir seu vocabulário em inglês, observar a posição dos textos nas páginas para definir a importância deles no contexto (alguns vêm fora dos balões e, segundo Shiro, possuem importância menor), perceber a força ilocucionária das intervenções das personagens por meio da forma dos balões e da postura delas dentro dos quadros. Shiro também apresentou uma consciência da natureza cultural do gênero, conseguindo identificar a origem dos mangás pela direção da leitura (da esquerda para a direita em quadrinhos ocidentais, coreanos e chineses, e da direita para a esquerda em quadrinhos japoneses), representações gráficas das personagens (os japoneses têm olhos grandes, rostos infantis), forma de balões de fala (horizontal, em quadrinhos ocidentais, e vertical na Ásia Oriental). Shiro compreende o conceito de gênero e caracterizou o mangá dentro de alguns critérios: audiência (ela sabe que saber o público a que o mangá se endereça influencia na tradução que será feita), temas, elementos discursivos e linguísticos, e convenções gráficas.
Os autores concluem afirmando que este artigo destaca a necessidade de se abandonar o modelo de ensino de língua estrangeira que considera apenas a linguagem textual como o modo exclusivo de comunicação, sendo necessário incluir os recursos multimodais que contribuem para construir o significado do texto.

Propomos para discussão e reflexão desses textos as seguintes perguntas: no ambiente escolar, é possível trabalhar com essas “práticas digitais vernáculas”? De que forma? Para o grupo pesquisado, a recriação do universo de origem do texto é mais ou tão importante quanto a qualidade da tradução. Até que ponto esse pensamento resulta em um aprendizado eficaz de uma língua estrangeira? De que forma os aspectos multimodais favorecem a aprendizagem de novas línguas?

Susane

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